quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

- Crises, Conspirações e Classe



Ivan J., 07Jul07

Sumário

Crises e conspirações
A crise real
Conclusão


Crises e conspirações


No texto "É oficial: começou a crise nos EUA" de Richard C. Cook[1], que segue abaixo e que eu comento a seguir, gostaria de destacar a seguinte e intrigante passagem:

"O facto do crac estar a ser anunciado nas páginas do Washington Post demonstra que é um facto inelutável. Os Bilderbergers (grifos - Jason), ou quem quer que seja ao que diz o Post, já o decidiram. Deixa saber a todos, para que não haja qualquer dúvida, que está na hora de fechar as portas, pôr-se a salvo, acumular dois anos de comida enlatada, blindar os seus activos, enfim fazer o que for necessário."

Trata-se dos "Bilderbergers" que grifei. Se buscarmos as referências na Internet encontraremos uma montanha de textos sobre o Clube de Bilderberg nascido nos anos 1950 que o remetem às correntes mais ocultas e sinistras da Maçonaria com destaque para os Illuminati, fundada na Bavária na segunda metade do Século XVIII. Para quem gosta de uma boa história das conspirações, dar de frente com o Clube de Bilderberg deve encher os olhos.

As saudações ocultistas de Bush, Sarcozy e Berlusconi que causaram tanto alvoroço na imprensa, para citar apenas os casos atuais e mais notórios, quando de seus discursos de posse, são bem características desta inelutável dimensão oculta e ocultista da burguesia global, uma classe muito pequena e muito poderosa.

Na verdade a burguesia internacional se organiza, conspira 24 horas por dia. É sua forma de ser, de exercer o poder que lhe é inerente. Isso não quer dizer que a tese básica da Teoria da Conspiração seja conteúdo para alguma coisa. Mas tanto as teorias como as conspirações mesmas são forma. A dialética da crise e da revolução, com suas rupturas e revolucionamento de lógicas e processos, é de longe o fator que explica os limites das conspirações dentro outros modos de ser da alienação e da dominação de classes. Este clássico aforisma, no entanto, está longe de bastar-se a si mesmo, tendo que ser demonstrado no realidade corrente e na potencial da revolução futura.

O movimento operário também teve seus momentos de conspiração e tem continuamente um impulso para constituir "sociedades secretas", que tanto foram combatidas por Marx, Engels, Lênin e etc. As sociedades secretas, seitas e sectas não são a forma de organização para a emancipação da classe, embora sejam um fenômeno natural e inevitável no solo social da própria classe.

Lênin tem uma posição explícita a respeito, exatamente quando a Maçonaria pretendia entrar em bloco na Internacional. Se esse foi um evento político, algumas versões mais sensacionalistas do episódio do "Trem Blindado" e do atentado que Lênin sofreu, usam uma de suas frases lapidares para tentar comprovar ao menos um "contato" dele com os círculos ocultistas: "Para fazer a revolução faz-se um pacto até com o diabo".

Por outro lado, a crítica à conspiração e às seitas podem ser feitas a partir de vários 'pontos de vista', sendo que a visão crítica da democracia pequeno-burguesa a respeito tem milhares de páginas.

Claro que não se trata de moral ou ética quando se aborda um tema desses.
Na verdade trata-se de um item no vasto desenvolvimento do vastíssimo assunto "CONTEÚDO E FORMA DA ORGANIZAÇÃO DA CLASSE".

A crise real

As crises cíclicas, ou "crises industriais" são fundamentais no arcabouço da economia política dos trabalhadores, que é a teoria de Karl Marx e nenhuma outra.

Claro que temos a posição simplista e reformista de um Mészaros a respeito do caráter digamos anódino das crises cíclicas: elas não ameaçam o sistema e são parte constituinte de seu movimento digamos normal. Seria pueril essa posição caso se tratasse do militante desavisado. Sabemos, no entanto, onde ele quer chegar: CRISE ESTRUTURAL. A tal da crise "estrutural" é totalmente estranha à teorização marxiana e revolucionária. Infelizmente, talvez, a inspiração de Meszáros é Mandel. Mandel neste ponto foi, digamos, eclético tentando incorporar à economia política dos trabalhadores os ciclos longos de Kondratief (40 a 60 anos). Deu merda, claro! A teorização de Kondratief é inutilizável, além de não ter a menor consistência teórica com o todo marxiano - como disse, para mim é em Marx (Manif e Livro I do Capital) que se encontra a totalidade teórica, o núcleo duro, a referência fundamental, da "economia política dos trabalhadores" (Marx).

Em Mandel esta outra, vamos dizer, dimensão da crise do sistema, que vem de um movimento longo do capital tem um endereçamento político específico: o mundo estaria em crise desde as primeiras décadas do Século XX, as condições objetivas para a revolução estariam dadas, a revolução é uma questão de organização! Esta, muito resumidamente, seria a tese geral do trotskismo pós-trotsky. A chamada teoria da "decadência" também compõe nessa demonstração de que o ativismo político cabe a qualquer momento desde as crises do início do Século XX. Não é à toa que aqui se mobiliza também a economia política de Rosa Luxemburgo: do ponto de vista da economia política, Mandel acaba sendo um tributário do luxemburguismo econômico, embora num certo aspecto político seja um leninista.

A chamada "crise estrutural" de Mészáros caminha à direita de Mandel - mesmo que Mandel não seja nossa referência. A crise estrutural estaria posta desde os anos 1970. Mészáros é explícito no argumento de que as "crises cíclicas" pertencem à normalidade da reprodução do sistema, não o ameaçam e, portanto, as massas exploradas devem encontrar seu motivo para colocar-se em movimento em outras determinações. Aí vem aquela missa toda de que o sistema não produz mais valores de uso, coisas úteis e sim valores de troca, não mais desenvolve a humanidade etc etc etc..., que do ponto de vista teórico é pueril pois tenta encontrar na moralidade, na condenação ética do sistema, a razão para colocar-se em movimento os opositores que defendem um outro sistema: o socialismo. Claro que a questão da assim concebida revolução também é uma questão de organização, de atividade "política". Daí brota uma estratégia política essencialmente reformista e a-classista pois são poucos os que discordariam que o sistema capitalista é prejudicial à saúde!

Em suma, a diminuição ou negligenciamento teórico da dialética econômica que envolve a teoria das crises e a teoria dos ciclos industriais de Marx tem implicações catastróficas para o militante revolucionário. As análises de conjuntura que daí emergem são de um ecletismo, de uma superficialidade características e que fazem, no entanto, a quase totalidade dos tipos que vemos suceder-se no movimento operário atual e no movimento socialista em geral. A emergência da classe trabalhadora está DIALETICAMENTE ligada aos ciclos e às crises econômicas. A PREVISÃO que desconsidera essa dialética está fadada ao senso comum em política e teoria. A classe proletária é uma classe especialíssima, não só em sua condição de viver mas também em sua forma, momento e conteúdo ao expressar-se. O momento da ação, o momento em que a classe se põe em movimento, se auto-organiza, busca ativamente a consciência de sua condição, da totalidade do mundo que a produz, da natureza de seus inimigos, busca a natureza de sua missão histórica, é um momento profundamente dialético. Ele acontece de modo especial, como ruptura, como salto, como inflexão radical, como revolucionamento da práxis (ad Feuerbach). É o momento em que o partido é possível, em que a questão da organização concretamente e efetivamente se coloca, é o momento em que fica clara, evidente, a máxima do socialismo revolucionário de que a revolução é obra dos trabalhadores (AIT).

Vemos então as implicações importantíssimas e vitais de considerar-se ou desconsiderar-se os "ciclos industriais" (Marx) nas análises do sistema, nas análises de conjuntura, nas previsões. Há algum tempo eu venho procurando ressaltar a importância de termos total consciência da dialética das determinações históricas, econômicas, sociais e políticas para fundamentar a subjetividade militante da classe proletária. Até a burguesia e seus veículos de comunicação já não conseguem mais ignorar o advento de mais uma crise cíclica nos USA.
Mas, e isso é importantíssimo, um outro cenário bem mais grave que os anteriores está cada vez mais em pauta: o último relatório do BIS (Banco Internacional de Compensação, que é o Banco dos Bancos Centrais) traz um dramático alerta quanto ao contágio global das crises setoriais que estão ocorrendo na economia norte-americana. De um 'hard landing', agora já se descortina a possibilidade de uma depressão global.

Conclusão

Estou estudando muito isso tanto em termos teóricos como no acompanhamento dos fatos. Está muito interessante.
O proletariado brasileiro tem fortíssimas chances de ver-se lançado num momento precioso de despertar a partir dessa nova crise cíclica. O núcleo duro operário da classe é que é determinante nesse processo. É nesse núcleo radical que se forma a organização revolucionária. E tudo isso, dada a natureza da crise, que é dada pela natureza e pelo nível de desenvolvimento das forças produtivas alcançado nesse início de século, será muito, muito rápido, coisa de uma ou duas décadas no máximo - desde que confirmado o cenário de que as "crises industriais" ou crises cíclicas tendam mesmo a agravar-se. Estamos falando, claro, no início do processo de constituição da classe em classe para si.
No entanto, o mundo da reprodução do capital é criativo, tem possibilidades que nós estamos longe de compreender, mesmo longe de ver, e todas as tendências a um agravamento da crise podem refluir e o sistema lançar-se num rumo virtuoso. Será que vão industrializar a África negra? Que papel isso teria no conjunto do capital social mundial? Relançaria o sistema por mais algumas décadas?
Bem, incertezas, incertezas, incertezas...


Notas


[1] in http://www.globalresearch.ca/index.php?context=va&aid=5964

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Democracia Proletária agradece seus comentários.
Deixe seu Email,seu Blog ou sua Página.