sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

- Função histórica da crise do Governo Lula e do PT


Os limites definitivos da SD no Brasil

Fechamento do Ciclo Histórico da Social-Democracia no Brasil


Ivan J., 11Jul05

Sumário
- Anotação de 01 de Janeiro de 2008
- O OLHO DO FURACÃO
- TESE GERAL das JORNADAS DE JULHO do “13” (9, 10 de Julho de 2005): a América Latina está pronta para uma revolução proletária
- FUNÇÃO HISTÓRICA DA CRISE ATUAL DO GOVERNO LULA E DO PT: os limites definitivos da SD no Brasil (versão 10/11Jul05)


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Anotação de 01 de Janeiro de 2008


O texto “Função Histórica da Crise Atual do Governo Lula e do PT: os limites definitivos da SD no Brasil” foi o primeiro a tratar numa perspectiva histórica o significado do ciclo que se encerrava e que estava dando lugar a outro. Click na figura acima para ampliá-la. (*)
Formulações surgiram depois para caracterizar o ciclo que se encerrava como sendo o do PT e da CUT. Nossa posição sempre foi a de que PT e CUT eram expressões de algo muito mais profundo e arquetípico que na verdade os havia colocado. PT e CUT eram encarnações de um processo mais profundo, mais amplo. Este processo econômico, social e político, a meu ver, era o projeto social democrata. Ele havia cumprido toda a sua trajetória, toda a sua função mistificadora e, por fim, havia chegado ao poder do Estado. Através dessa trajetória a Social-Democracia, encarnadas localmente no PT e na CUT passou por diversas fases e, por fim, desnudou sua natureza, natureza que sempre teve.

A meu ver conceber o ciclo que ora se fecha como sendo do PT e da CUT é ficar prisioneiro das formas e não alcançar a essência. Essa essência, como vimos acima, é uma forma histórica recorrente nas sociedades capitalistas maduras: a social-democracia. Qual o problema dessa forma de conceber o ciclo histórico que se encerra? Se o ciclo é do PT e da CUT, então significa que não estaria na concepção e no programa a questão, mas sim na forma como o PT e a CUT transitaram nesse processo, o que caracterizaria uma insuficiência das lideranças. Superar o ciclo do PT e da CUT significaria então, em essência, recolocar a mesma concepção e o mesmo programa, mas com lideranças renovadas.

Para as oposições minoritárias se demais minorias que durante todo esse processo estiveram orbitando em torno do poder e da principal oposição que era o próprio PT e a CUT, a concepção de que tratou-se no fundo do ciclo do PT e da CUT afeta as suas próprias críticas e as perspectivas que descortinam para o período a vir. Aquelas críticas das oposições no período anterior, se eram limitadas, continuarão a sê-lo agora com o esgotamento do ciclo anterior. A análise do que seria o próximo ciclo que vemos emergir dessas correntes são tão insuficientes quanto o eram suas críticas aos poderes constituídos e às principais oposições no ciclo anterior.

O encerramento desse ciclo da Social-Democracia coloca, nos seus estertores a abertura de um novo ciclo histórico, o ciclo do Socialismo Proletário. Neste ciclo, dadas as condições objetivas, o proletariado tenderá a constituir-se em classe autônoma frente ao capital a partir da liderança social e política de seu núcleo duro, o operariado industrial dos setores de ponta da economia. É desse núcleo duro que partirá a força e o paradigma para a fase das lutas econômicas, até que as formas de organização econômicas evoluam para uma organização multi-profissional e multi-regional, organizando e expressando os interesses do proletariado brasileiro. Com o aprofundamento da crise, as lutas econômicas, num determinado grau de seu desenvolvimento quantitativo e qualitativo, colocará na prática a necessidade de um salto na organização da classe: trata-se da organização da classe para a luta política. Nesse momento é que surgem as condições reais para que se coloque para a própria classe a questão do partido da classe, o partido operário. Este ciclo, o ciclo que estamos chamando de ciclo do Socialismo Proletário (distinguindo-o do Socialismo Pequeno-Burguês e do Socialismo Burguês), levará a classe até a conquista do poder e a instauração do seu estado de classe. Aí, inicia-se um outro ciclo, uma outra transição.

Hoje essa concepção dos ciclos políticos está bem mais aprofundada. Voltaremos a ela nas postagens a vir.

O OLHO DO FURACÃO

O olho do furacão pode ser muito pequeno
ou já estar se estreitando drasticamente

O furacão[1] quando atinge uma região, o faz com ventos que se aceleram e tornam-se avassaladores. Trata-se da chegada do furacão. Os ventos vêm de uma direção e rumam para a oposta causando estragos.

No entanto, conforme o furacão se move sobre a região, o OLHO do furacão vai se aproximando. Aí vem a passagem do OLHO do furacão. Quando ele está sobre a região, nenhum vento sopra, nenhum som é audível e o céu acima fica totalmente azul, aparecendo inclusive estrelas se for durante o dia. Conforme o furacão se move o OLHO vai dando lugar novamente a tormenta sobre a região. No entanto, agora os ventos avassaladores sopram na direção contrária.

Há alguns anos a NASA estava para lançar um foguete, mas um furacão se aproximou do Cabo Canaveral. O adiamento prolongado do lançamento envolveria problemas que implicariam na verdade em cancelamento do vôo dada as características do combustível. Por coincidência o OLHO do furacão ia passar exatamente sobre o Cabo Canaveral. Quando o OLHO do furacão chegou, eles fizeram o lançamento do foguete sem qualquer problema. Foi uma façanha genial, um lançamento espacial na passagem de um grande furacão.

Usamos essa imagem do OLHO DO FURACÃO para tentar caracterizar, em meio à saraivada de "cuecões", a qualidade do momento que estamos vivendo com a CRISE DO GOVERNO e a CRISE DO PT.[2].

A discussão em torno disso foi tão intensa que ao chegar em casa neste domingo, ao dormir sonhei.

Como foi o sonho? Lá estava o foguete para ser lançado, mas o olho do furacão era muito estreito. O foguete foi lançado, era imperativo. Ele subiu e entrou no buraco estreito entre as nuvens densas que giravam furiosamente. Ao sair na ponta superior do buraco rumo ao espaço sideral, o buraco tornara-se tão estreito que o foguete a alta velocidade "raspou" as bordas do buraco formado por nuvens densas, deixando inclusive a marca da sua passagem nas nuvens. OU SEJA, segundo meu sonho, o buraco está se estreitando e, consequentemente, a situação de falta de parâmetros e referências, de ausência total de ventos (SENTIDO) irá durar muito pouco.

Foi um sonho todo em cinza escuro. Primeiro eu via o olho do furacão de baixo, conforme o foguete era lançado. Depois eu o via de cima, conforme o foguete na decolagem saia dele. O foguete entrou no olho do furacão numa passagem já estreita e saiu dele numa passagem que havia se estreitado mais ainda. Interessante a psique sonhadora. Aliás, como Junguiano eu só posso estar muito impressionado com meus próprios sonhos.

o O o

TESE GERAL das JORNADAS DE JULHO do “13” (9, 10 de Julho de 2005): a América Latina está pronta para uma revolução proletária

Afinal, o marxismo revolucionário tem o que a dizer sobre a revolução latino-americana e sobre o seu proletariado?

As discussões foram hiper-intensas e muito criativas no encontro com o pessoal do “13”. Foi a primeira vez que procuramos uma via para encarnar as discussões que até agora deram no nível mundial da GeoEconomia e da Geopolítica. Buscamos os desdobramentos e as implicações da geopolítica e da geoeconomia do capital sobre a geopolítica e a geoeconomia dos trabalhadores à luz dos movimentos sociais proletários emergentes na América Latina.

As previsões de que a América Latina irá desempenhar um papel fundamental e original na "seriação" da revolução mundial[3] estão se confirmando: no mundo, a única região "vermelha" é a América Latina, sendo que é vermelha não em função dos seus governos populares ou de esquerda, mas em função da emergência, ainda pontual e incerta, mas já com alguma persistência, do proletariado.

Várias "especificidades" foram abordadas:
a) a do proletariado argentino
b) a do proletariado boliviano
c) a do proletariado venezuelano
d) a do proletariado brasileiro

Todos os pontos cruciais dessas emergências (não discutimos Equador, Paraguai e México, apenas foram tocados en pessant) foram muito discutidos e profundamente problematizados. Não creio que haja hoje discussões nesse nível sendo travadas nas extrema-esquerdas, ou pelo menos não tenho notícias que tal esteja ocorrendo.

No sábado retomamos e discutimos os modelos geopolíticos e geoeconômicos globais, adicionando as recentes movimentações da China em relação ao Eixo Paris-Berlin-Moscow. Já aí emergiram vários temas, particularmente o ataque frontal da economia política de esquerda contra a centralidade do proletariado e a revolução proletária na América Latina. Começamos a debater as formulações de Ricardo Antunes. No sábado, com uma agenda já conhecida, a discussão intensificou-se e foi radical.

Já no domingo tornou-se sem limites. Dentro de cada escândalo do governo as esquerdas estão também desabando, tanto as da "reforma" como as da "revolução". Não houve qualquer assunto "intocável". Os melindres foram afastados. O trabalho foi centrado nos movimentos sociais proletários da América Latina.

Um companheiro do “13”, Jacaré, fez um relato de sua recente viagem à Bolívia, trazendo muitos e fresquíssimos subsídios. Vimos algumas imagens em VHS e fotos das estupendas lutas em La Paz.

Foi muito discutida a natureza dos movimentos "piqueteros" da Argentina. Discutiu-se a sua eventual natureza “lumpen” ou sua natureza proletária. Companheiros estiveram em contato com as mais diversas conformações de piqueteros e suas diferentes formas de expressão. Companheiros estiveram com “Barrios de Pie”, com “MTR” e com outros. Discutimos a natureza dos movimentos de ocupação de fábricas. Discutimos a natureza da organização da classe em partido revolucionário.

Como era de se esperar a discussão sobre a "Razão de Estado e Razão das Massas Proletárias" nos atingiram em cheio.

Daí a questão da natureza da Revolução Bolivariana e da atuação geopolítica de Hugo Chávez e Fidel Castro no seio dos movimentos proletários e suas interlocuções. Do mesmo modo foram discutidas as estratégias em curso dos movimentos radicais e moderados nessas revoluções.

Discutimos a respeito dos cenários de eventual tomada de poder pelo proletariado e campesinato revolucionários (possibilidade concreta na Bolívia) numa situação com risco forte de isolamento. Discutimos as questões relativas ao eventual perfil de governos revolucionários nesse contexto de desigualdades e desnivelamento das lutas sociais entre os diferentes países.

Discutimos se "valeria a pena" tomar o poder pela via revolucionária quando essas condições políticas e subjetivas se apresentassem. Seria viável sustentar o poder?

Discutimos sobre os contornos gerais das TAREFAS ECONÔMICAS para países com D1 e sem D1[4]. Creio que uma discussão muito avançada, mas no quadro em que os movimentos sociais proletários se encontram na América Latina, uma discussão procedente. Como essas tarefas seriam implementadas pela burguesia, pela pequena-burguesia e pelo proletariado revolucionário.

Discutimos a natureza do "socialismo latino-americano" (Dussel, Aricó, Harnecker e muitos outros) como parte importantíssima da "herança" que deverá ser devidamente superada para que o jovem e imenso proletariado latino-americano possa tornar-se apto e liberado para enfrentar o seu inimigo: o capital.

Discutiu-se as condições da reunificação da classe. A natureza das correntes do marxismo revolucionário que nasceram nesse contexto de contra-revolução. Discutiu-se sobre a natureza da solidariedade proletária internacional e suas condições concretas de efetivação, p.ex. no Brasil.

Depois, discutimos os indicadores do aumento do Exército Industrial de Reserva no Brasil (com base na Região Metropolitana da Grande São Paulo), suas implicações para uma retomada das lutas proletárias, inicialmente a partir das franjas do proletariado[5]. Comparamos com a dinâmica do movimento na Argentina. Consideramos as hipóteses de uma retomada, inicialmente, a partir do núcleo operário desenvolvido. A avaliação inicial é que a retomada provavelmente ocorrerá primeiro a partir das franjas externas do proletariado, dentro do EIR das grandes metrópoles. Inúmeros desafios estão postos, mas caminhos são visíveis... ainda não trilháveis. Interessante destacar a presença de vários militantes com vasta experiência nesses tipos de luta.

Discutimos a respeito do agente revolucionário. Aí emergiu a discussão do que é o proletariado, do que é o lumpenproletariado, do que é o operariado qualificado e do que é o operariado não-qualificado, o que é a aristocracia operária. Qual a função de cada um desses segmentos na revolução? Minha posição (Marx, Engels, Lênin) por enquanto, em função do que encontrei em Marx, Engels e Lênin, é de que a base social para uma política revolucionária radical do proletariado é a massa dos operários não-qualificados da grande indústria - este é o núcleo duro da política revolucionária e de seu partido. Me parece, num primeiro e hiper-precário approach, que considerando mesmo os últimos movimentos de 78 e início dos 80's no Brasil, essa visão acaba se confirmando. Na verdade, a questão crucial é o que se entende por LUTA OPERÁRIA REVOLUCIONÁRIA. Há todo um estudo a ser feito em Marx, Engels, Lênin e Rosa sobre o papel e a função dos sindicatos e da luta econômica no conjunto da luta revolucionária da classe.

Depois discutimos sobre a natureza cíclica e a história recente dos ciclos econômicos mundiais. A partir daí foram feitas cenarizações sobre o retorno da crise cíclica. Não cedemos à tentação de "agendar a revolução". Não há mecanicismo. O que se procura avaliar é a probabilidade de ocorrência de uma inflexão "singela" na dinâmica da subjetividade do proletariado a partir das cenarizações da próxima crise cíclica. A natureza dessa inflexão foi devidamente apresentada para não ser confundida com a abertura de uma vaga revolucionária e muito menos de uma situação revolucionária.

Discutiu-se sobre os conceitos de "vaga revolucionária", "vaga contra-revolucionária", "situação revolucionária". Os problemas na verdade foram tocados, mas já revelou-se a crucial importância desses conceitos ou noções. Como caracterizar o momento que vivemos, como compreender a natureza das diferentes espécies de lutas em que o proletariado pode estar, ou não estar envolvido?

Várias outras foram as questões que emergiram, sobre a qual avançamos e discutimos em caráter inicial e muito emocionados, eventuais TESES. Há necessidade de aprofundarmos essas TESES INICIAIS sobre todos esses pontos. Sobre essas teses há que se levantar as CONTRA-TESES junto à economia política burguesa, pequeno-burguesa e junto às extrema esquerdas. Só assim poderemos começar a esboçar as nossas SÍNTESES.

VENEZUELA E A REVOLUÇÃO BOLIVARIANA - um enigma para mim particularmente; é hoje a principal prioridade em termos empíricos, compreender a Revolução Bolivariana e a situação e função do proletariado nela. Minha posição de partida é a de absoluto ceticismo em relação com o caráter revolucionário do governo venezuelano. É revolucionário num sentido geral dado estar atuando a favor do desenvolvimento das forças produtivas capitalistas, sendo, portanto, um governo pró-proletarização[6].
No entanto, é um governo do capital que tem tido condições de mobilizar o proletariado venezuelano, com pleno êxito, em prol do desenvolvimento capitalista na Venezuela. Trata-se de uma situação típica já colocada por Marx, Engels e Lênin da classe em si a reboque de setores da burguesia ou da pequena-burguesia (Manifesto). Em suma, o proletariado não está organizado aí autonomamente como classe para si perseguindo seus próprios objetivos, cumprindo com os imperativos do desenvolvimento das forças produtivas, mesmo as capitalistas, segundo seus desígnios. O proletariado não está organizado autonomamente pressionando seus respectivos estados capitalistas a fazerem tal ou qual política interna ou externa. Do mesmo modo, o apoio local ou a partir de outro país, que se dá ao governo nacional deve ter como lastro a respectiva base social em movimento, o proletariado em movimento ou a perspectiva desse movimento, tem que contemplar a situação concreta do proletariado, no caso, venezuelano e o do seu respectivo país, assim como a classe no seu conjunto.
Só a partir daí o "TEXTO" DA POSIÇÃO DO MARXISMO REVOLUCIONÁRIO DE APOIO OU NÃO, contemplando todas as variáveis do desenvolvimento das lutas de classes proletárias pode ser redigido ou falado. Começo, sob imensa pressão, a rastejar na questão, procurando os nortes e etc. Não consigo apoiar nenhuma das posições disponíveis no meio das esquerdas. Elas vão do "senso comum" ao "oportunismo", "da tradição do socialismo latino-americano" até o "voluntarismo trotskysta". Estou em suspenso nesta questão, procurando a perspectiva do proletariado venezuelano, do proletariado internacional. As posições correntes na esquerda não convencem e padecem das precariedades conhecidas e tradicionais. Os insights por enquanto vieram das lutas concretas do proletariado argentino e boliviano. Falta o quadro das lutas concretas do proletariado venezuelano. Já as condições concretas do proletariado brasileiro ainda estão por emergir. Em suma, são necessárias fontes sobre a situação do proletariado venezuelano, principalmente o de Caracas.
Qual a natureza do Estado venezuelano, qual a natureza do governo e do movimento de massas?
Qual é o momento histórico por qual passa a Venezuela?
O JORNADAS DE JULHO de 2005 do “13” cumpriu tudo o que se esperava e algo mais. Deu subsídios imensos para a continuidade trabalho. Foram levantadas e discutidas as questões determinantes, que deverão alimentar as investigações por mais um grande tempo.

FUNÇÃO HISTÓRICA DA CRISE ATUAL DO GOVERNO LULA E DO PT: os limites definitivos da SD no Brasil (versão 10/11Jul05)

Estamos com uma crise da política institucional em andamento[7] que se apresenta como um show de mídia, um show da democracia burguesa - por mais dramáticos que sejam os seus lances e envolva nas suas formas as esquerdas numa verdadeira catarse.

Para o que interessa:- não há por enquanto qualquer ameaça à ordem democrática: a democracia plena vige.- há crise política, cuja saída será democrática.- parece que o cheque-mate de FHC a Lula ("não se recandidate", no penúltimo fim-de-semana) teve resultado e encaminhamento. Não sei onde li que alguém vai apresentar uma emenda ou o que seja no sentido da proibição de "reeleição". A confirmar.- parece que esse é o ponto. Lula pode reeleger-se ainda, mas sem qualquer lastro político de governabilidade. Isso em si é um perigo para o capital (financeiro-industrial-comercial), em suma, para as condições da reprodução "normal" do modo de produção capitalista como está estruturado no Brasil. Lula não é um perigo por causa da possibilidade de "trair" o capital. Lula é um perigo por causa da sua flagrante insuficiência política. Isto já ficou totalmente claro[8].

O que fazer num momento como esse? Será que há nas esquerdas e particularmente nas extremas-esquerdas quem ache que com o atual desgaste de Lula e do PT irá assumir seu lugar ou ocupar espaço? Que essa maneira de ver as possibilidades do real seja próprio das centro-esquerdas expelidas do PT, é compreensível. Mas será que alguém que esteja no jogo atual, visando uma transformação mais profunda ainda acha que nesse inter-jogo teria algum espaço.E de fato, as aberturas que o momento que atravessamos na política institucional e sua crise são muito mais amplas.

Sempre paira a interrogação: há quem avalie seriamente ser possível conseguir alguma coisa concreta para o vasto proletariado brasileiro participando na política institucional. As "esquerdas" internas do PT conseguiram exatamente NADA de relevante e duradouro para a "cidadania" - muito ao contrário: a chamada "exclusão" aumentou drasticamente. Essa é uma constatação definitiva e transcendente. Seria possível imaginar as extremas esquerdas "conquistando" algo, na medida em que "desfrutam" de parcos "1%" ou algo mais de peso para a "governabilidade".

As lições históricas do movimento socialista radical mostram que a democracia burguesa é o terreno mais favorável para que a luta de classes vá até o fim, embora não seja o único (Marx, Lênin). É um terreno favorável para a luta proletária, mas não se trata nunca de inserir-se na democracia burguesa e fazer o jogo do "economismo" (Lênin), do "oportunismo" e "reformismo" (Rosa e Lênin). O parlamentarismo e o sindicalismo revolucionários (Marx, Lênin, Rosa) são as únicas formas de fazer uso revolucionário da democracia burguesa. A dialética entre democracia burguesa e democracia proletária, entre política burguesa e política proletária, é bem mais complexa do que uma "participação" no jogo eleitoral institucional e no estado de classes do capital podem contemplar – aliás, as formas dessa "participação", quando é o caso, o que é raro, são determinadas por aquela dialética acima (Marx, Lênin sobre parlamentarismo revolucionário).

A atual crise do PT e de Lula não é a crise de um Presidente da República e de seu partido.É, de um lado, uma crise de governo que pode, a depender dos cenários próximos, transformar-se rápida e surpreendentemente numa crise de estado. Esta seria uma dimensão política imediata dessa crise.Mas, no que toca às questões estratégicas e de princípios do marxismo revolucionário, a crise de Lula e do PT constitui uma crise com muito maior alcance. É a crise de uma política de esquerda tradicional do Século XX voltada exclusivamente para a política institucional burguesa, ou seja, é uma crise seríssima da política de esquerda voltada exclusivamente ou precipuamente para a própria democracia burguesa.

As teses que falam em "traição" de ideários originais é limitadíssima e não possibilita de modo algum a compreensão da atual crise que o PT e o seu Governo passam.

Não é possível uma compreensão profunda dessa crise a partir da tese de que se trata de uma crise de "politicismo" - mesmo porque em assim sendo ela seria uma crise "teórica", "abstrata". A noção de uma crise de "politicismo" não é apropriada, pois incorre num idealismo, como se a crise atual fosse uma crise de idéias na esquerda, ou de práticas que emanam de idéias e concepções, enfim, crise de "teorias" ou da falta delas[9].

Na verdade temos uma crise muito mais séria, pois trata-se da crise do reformismo e do oportunismo (Lênin), onde se trata antes de mais nada de projetos desta natureza mesma efetivamente implementados e muito bem sucedidos, cujo objetivo está em cooptar a própria classe trabalhadora, contribuindo para recalcá-la enquanto momento de classe em si. Trata-se, portanto, da crise de um ser, crise cuja raiz não está no seu pensar. É, portanto, uma crise dessa cooptação mesma devido à crise das condições históricas, sociais, políticas e econômicas que fizeram com que essa cooptação fosse possível durante todo esse tempo e estivesse agora prestes esgotar sua fase "ingênua".

Não é, enfim, a crise de um pensar, mas é a crise de uma corrente da esquerda tradicional que na verdade é expressão inevitável de uma possibilidade inscrita no próprio ser do modo de produção capitalista em geral (Marx, Lênin), mas também nas condições específicas de como o capitalismo se desenvolveu no Brasil.Mas é importante saber que o reformismo e o oportunismo (Lênin) continuarão existindo e até se desenvolvendo no Brasil, a despeito do seu inerente "politicismo", pelo fato de possuir uma base social concreta nas classes médias e na aristocracia operária. No entanto, seu projeto e sua capacidade de cooptar as massas no Brasil é que entra em crise. Doravante o oportunismo e o reformismo serão confrontados com a realidade concreta do que foi um governo Lula e do que foi concretamente o PT: essa é a função histórica da crise de Lula e de seu partido.Do ponto de vista político, é a hipocrisia inerente do capital e da democracia burguesa que se escancara (Engels). É a crise da tese do "socialismo prático", reformista, que no seu paroxismo exige que para se chegar a qualquer coisa de "concreto", de "palpável", para uma "conquista", ou nem que seja só para "resistir", é necessário fechar os olhos para a hipocrisia inerente à política institucional, fechar os olhos para o que os institucionalistas fazem, ou são obrigados a fazer, na política "real", na política "do possível", na política do "máximo de consciência possível".

Trata-se da crise da política "pragmática", todas elas pertencentes aos diferentes projetos de governos burgueses ancorados quer seja nas frações da burguesia ou na pequena burguesia.Mesmo em se considerando, só e humildemente, a "conquista do possível", sem qualquer anseio "revolucionário", sabemos que nada será conseguido nas condições concretas da economia brasileira no âmbito dos projetos do "economismo" e do "reformismo". Ou seja: nenhuma "renda" será distribuída, nenhuma conquista social será alcançada.Esse é um resultado fatal, inevitável quanto às metas da política reformista, que está inscrito na natureza própria do padrão de acumulação vigente. Cabe esclarecer aos navegantes do oportunismo (Lênin) que a POLÍTICA ECONÔMICA é endógena, nada mais é que uma expressão, emanação necessária e unívoca, desse mesmo padrão de acumulação. Nesse sentido não é mudando a política econômica que se muda o padrão de acumulação. E não é fácil mudar o padrão de acumulação que vige nos países periféricos desde sua inserção no modo de produção capitalista, um padrão de acumulação que tem como base a predominância da mais-valia absoluta e que compõe um todo que é tão somente a DIVISÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO.
Hoje, início do milênio, não há como mudar pacificamente ou mesmo violentamente a divisão internacional do trabalho no mercado mundial. Essa mudança só pode ser resultado de uma crise catastrófica que levará à alternativa revolução ou guerra inter-imperialista. Passaremos muito em breve por essa disjuntiva, como já passamos antes (Marx, Lênin, Rosa).Temos então uma crise em desenvolvimento, ou seja, a negatividade passiva do capital.

No entanto, diante de uma negatividade como a colocada acima, onde encontrar a negatividade ativa e a positividade proletárias? Isso nos dirige então para a única possibilidade de reverter a atual situação, a atual política, que nada mais é do que a política burguesa sob a vigência plena da sua democracia. A única possibilidade de negatividade ativa e de positividade está na reemergência das massas proletárias, no caso do Brasil. Somente estas, pela sua própria força, seus próprios meios, poderão constituir um elemento novo ao adentrar de modo autônomo a arena da política e transformá-la (vide Argentina e Bolívia). Só alicerçado nas massas auto-mobilizadas e auto-organizadas será possível uma outra política e essa política tem nome: democracia proletária, ou no máximo proletário-camponesa conforme o caso.

Mas, poderia ser arguído: "e enquanto as massas não estão aí, o que fazer"?

Temos que ter uma noção de vaga revolucionária e vaga contra-revolucionária. Enquanto na vida política de Lênin tivemos um único movimento de desenvolvimento da classe para si[10], em Marx tivemos vários, ou seja, tivemos a alternância da vaga revolucionária e da vaga contra-revolucionária. Portanto, no estudo detalhado dos diferentes momentos políticos da vida de Marx é que está a lição de que precisamos para vermos essas duas situações distintas: classe em si e classe para si, existência e não existência de uma vaga revolucionária.

O caso da maré montante do movimento operário na Rússia de finais do XIX e início do XX, quando Lênin inicia sua fulgurante militância, não é de nenhum modo o caso do Brasil de hoje.

Começa a sê-lo, ainda a confirmar pela persistência, na Argentina e na Bolívia, sem que isso ainda se configure uma "vaga revolucionária", o que já em si é uma interessante hipótese de trabalho. Embora me faltem muitas informações, não acredito que já seja esse exatamente o caso da Venezuela, pois lá não existe um movimento para organização autônoma dos trabalhadores como já acontece nos outros dois países - mas preciso informar-me bem melhor.

Hoje na Argentina existe uma ampliação e aprofundamento qualitativos do movimento proletário. Dá seu arranque basicamente no movimento piqueteiro antes de 2001 e mesmo em 2002 e 2003. Agora já está abrangendo os trabalhadores assalariados dos setores de serviços públicos, os trabalhadores terceirizados da indústria e dos transportes, e, por fim, os trabalhadores "terceirizados" que alguns ainda insistem em chamar de "precarizados" - não sem uma intenção muito determinada.

O movimento na Bolívia de maio e junho passados, tivemos condições de acompanhar em detalhe na lista ESKUERRA.Desse modo, navegamos no Brasil, um momento de desespero das esquerdas reformistas, que atinge também algumas das correntes de extrema esquerda, que, no entanto, estão muito voltadas para a política institucional, aquelas mesmas que vivem de modo direto ou indireto orbitando na lógica específica das lutas institucionais, e que para elas voltam suas críticas, como que na contra-tendência do reformismo. Falta a essas esquerdas o elemento autofundante essencial: as massas proletárias em movimento.

Não existe outra forma de fazer política proletária que não seja aquela que se faz junto, com e no interior da classe proletária.Isso vemos em Marx, Engels, Lênin, Rosa e Trotsky. Se não é com a classe, no interior da classe, pela própria classe, como fizeram Lênin, Marx, Rosa que tipo de política concreta há para se fazer? Lutar com o quê, se não for com a força da própria classe em movimento. Os clássicos do marxismo revolucionário não tinham qualquer outra política que não fosse essa (veja-se as biografias políticas de Marx, Engels, Rosa, Lênin, Trotsky).

Mas há um problema sério em lidar com a "classe" que não pode ser nunca esquecido. Não se trata de qualquer "obreirismo" ou política de acordo com a "consciência possível", o que é no fundo a mesma coisa, obreirismo, ou seja, a faceta crítico-intelectualizada da política obreirista. A classe deve estar já em movimento próprio e não num movimento qualquer que não seja gerido por si mesma autonomamente.

Em suma, a classe, para que seja base para uma política organizacional, não pode estar em movimento a reboque da burguesia ou da pequena-burguesia (e talvez seja essa uma hipótese interessante para qualificar o caso venezuelano e sua revolução bolivariana). A classe, através dos seus setores avançados, já deve estar constituindo-se em "classe para si", em movimento autônomo. Essa qualidade presente no movimento proletário não tem nada de subjetivo ou relativo. Essa qualidade de classe para si é apreensível empiricamente a partir da avaliação dos movimentos sociais concretos, suas consignas, suas tendências manifestas. Ao fazermos essa avaliação dos movimentos sociais com base no proletariado brasileiro, não há como encontrar ainda sinais amplos e inequívocos de uma classe constituindo-se em classe para si. Essa é nossa situação e deve ser o primeiro elemento real para aferirmos a "correlação de forças".

Essa situação de ausência total do proletariado como classe para si no Brasil irá se perpertuar?

Sabemos que não, pois esta possibilidade está inscrita na própria natureza social e econômica do modo de produção capitalista, mais ainda quando observamos a natureza de seu desenvolvimento e reprodução atual no Brasil que depende de um exército industrial de reserva (proletário) cada vez maior.

Essa inflexão na consciência de classe, que torna-se de classe em si em classe para si, já pode ser perceptível no horizonte relevante?
Sim.

Como?
Não é tomando a realidade proletária como uma fotografia que se vai percebê-la, mas vendo a classe na sua dialética própria, em função da dialética própria da sua reemergência como ser social para si. É assim que é possível fazer uma avaliação específica das condições gerais do capital, dos seus cenários. Temos que ter como base a tese geral do marxismo revolucionário de que só uma crise do capital que se aprofunda e que se amplia pode colocar em movimento o proletariado como classe para si e, como dizia Lênin, possibilitando que a partir daí haja a produção de suas organizações de luta, de seu programa concreto e de suas lutas próprias.

Aí é possível fazer "alianças", praticar o parlamentarismo e o sindicalismo revolucionário, etc. Em suma, aí é possível fazer política, pois a classe tem seus líderes, suas organizações e sua massa mobilizada para lutar.

Economia - A análise da situação econômica global, continental e nacional abrem perspectivas bastante interessantes para que essa reemergência autônoma do vasto proletariado brasileiro possa ocorrer no nosso horizonte relevante.Política - A análise das condições políticas da burguesia e da pequena burguesia também apontam, como as das condições econômicas, para uma acelerada deterioração.
Base social - A análise das condições sociais em que se encontra o proletariado, com um Exército Industrial de Reserva que só faz crescer nas regiões metropolitanas, com uma proletarização massiva, também aponta para uma maturação vertiginosa em prol da eclosão de movimentos sociais proletários, dentre eles o movimento operário.

Desse modo, tanto no econômico, como no social e no político, a era da emergência de uma nova política, uma política proletária genuína, que sempre foi uma possibilidade, é agora um cenário com probabilidade crescente.

Vai acontecer?
Vai.
De que modo?
Certamente não será ainda a inauguração de uma vaga revolucionária, mas poderá significar uma inflexão - já falamos disso várias vezes.

Quando?
Vários cenários se abrem com base no estalo e no desenvolvimento da próxima crise cíclica. Se pensarmos nas dificuldades crescentes para a reprodução ampliada do capital social global, a deterioração crescente das condições de vida e trabalho do proletariado no Brasil já nos oferece um quadro bastante alvissareiro. Se adicionarmos os choques dos retornos das crises cíclicas, cujas hipóteses de agravamento se reforçam a cada dia, o quadro para uma inflexão melhoram mais ainda. Mas nestas especificações do "como" e do "quando", trata-se sempre de hipóteses e cenários quando falamos em movimento das massas proletárias no Brasil. Não consigo ir além de uma abertura de cenários muito plausíveis.

Observação en passant: ainda está por se compreender, no que tange à natureza do proletariado no Brasil, porque o marxismo revolucionário aqui embarcou tão fácil, tanto no espírito como na letra, nas teses correntes da "reestruturação produtiva" e da "precarização", que só podem levar diretamente a uma debilitação e desqualificação definitiva do proletariado como agente revolucionário. O impressionante é que a própria realidade desmente de modo flagrante as constatações anti-revolucionárias dessas teorizações.

Outras teses igualmente problemáticas do ponto de vista do marxismo revolucionário (globalização, mundialização, financeirização, decadência, das insuficiências das políticas neoliberais etc...) também estão presentes na grande maioria das análises e demonstrações das correntes revolucionárias. Nunca um trabalho teórico intenso foi tão necessário para avaliar criticamente toda essa produção teórica do reformismo que, no entanto, está presente na subjetividade das correntes revolucionárias no Brasil. Esse trabalho teórico só pode ter um sentido: restaurar a integralidade das teorias de Marx e Lênin como totalmente válidas para as lutas a vir do proletariado latino-americano. Claro que só o campo do marxismo revolucionário será capaz de uma tal empreitada teórica, a qual não consiste num esforço lógico e teórico das esquerdas em geral - é antes de mais nada uma tarefa que só pode ser implementada a partir de uma perspectiva política determinada, a da revolução proletária (Marx, Engels, Lênin, Rosa, Trotsky).

Notas

(*) Devo ao companheiro Scapi a inspiração para um diagrama acima que tenta expressar todo esse processo.
[1] O OLHO DO FURACÃO (impressões iniciais Jornadas de Julho do '13', em julho de 2005)
[2] Foi distribuído um texto rápido com o título "A Função Histórica da Crise de Lula e do PT". Abaixo vai uma 2a versão, feita na noite de 10 de julho de 2005, depois das intensas discussões com os participantes das JORNADAS DE JULHO do “13” (9 e 10 de Julho de 2005).
[3] Vide GeoReference 06 de 2003, antigo texto do site, agora desativado, www.geoeconomia.net.
[4] D1, departamento produtor de meios de produção; D2, departamento produtor de bens salário; D3, departamento produtor de bens de luxo.
[5] Para ver como essa cenarização evoluiu, há anotações e notas de comentários atuais à uma antiga discussão a respeito que podem ser consultadas em http://demopro.blogspot.com/2009/01/o-novo-e-o-mesmo-na-luta-de-classes-no.html.
[6] Anotação de 01 de Janeiro de 2008. Hoje nossa visão é a de que o estado venezuelano, assim como seu governo bolivariano, estão com imensas dificuldades para fazer avançar o processo de proletarização. O resultado do Plebiscito foi um sintoma dessa dificuldade. A crise cíclica irá colher o governo bolivariano na Venezuela com um déficit determinante de avanços nessa área.
[7] primeira versão em http://br.groups.yahoo.com/group/eskuerra/message/27959
[8] Anotação de 01 de Janeiro de 2005. Vimos que esse cenário não se confirmou, aliás, ao contrário: o resultado das eleições e o grau de governabilidade do segundo governo Lula estão sendo superiores aos do primeiro governo, pelo menos até o início de 2009. Essa cenarização contingente não prejudica em nada a análise que se segue no texto.
[9] ver texto de Sérgio Lessa "Crítica ao Praticismo 'Revolucionário' ", algumas mensagens acima - http://br.groups.yahoo.com/group/eskuerra/message/27906.
[10] Anotação de 01 de Janeiro de 2009. Esse continuum de uma vaga proletária na Rússia, que assumimos em 2005 como dado, após várias investigações, hoje não está mais tão assente. O período após a chamada “Revolução de 1905 foi de recuo total, de esfacelamento do movimento operário e de um desaparecimento virtual do POSDR para quaisquer efeitos práticos e mesmo formais – vide Lênin, trabalhos da época.

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