terça-feira, 30 de dezembro de 2008

- Dimensão Política dos Cenários da Conjuntura Econômica 29Out06



Aumenta a probabilidade da crise cíclica para final de 2006 e início de 2007


Ivan J., 29Out06 (*)

Sumário

1. Hora de colocar as crianças na cama e pensar sério na vida
1.1. Outubro indica maior desaceleração na economia norte-americana
1.1.1. A bomba estatística do BEA (Bureau of Economic Analysis)
1.2. Cenário hard landing: recessão no 1o (mais tardar 2o) trimestre de 2007
1.3. Alguns fatores
1.4. Impacto na economia brasileira
2. Previsões, cenários de incerteza e estatuto desta próxima crise cíclica
2.1. Arte da previsão
2.2. Talvez a maior crise desde o pós-IIa Guerra Mundial
3. Economia e luta de classes, a grande dialética
3.1. Economia e política
3.2. Hipótese básica das análises de conjuntura burguesas e pequeno-burguesas
3.3. O atual potencial das lutas operárias no Brasil
3.3. Luta política e teórica na realização do potencial operário
3.4. Condições atuais e as condições de 1978-80 para as lutas operárias
Conclusão

* * *

1. Hora de colocar as crianças na cama e pensar sério na vida

1.1. Outubro indica maior desaceleração na economia norte-americana
Após a divulgação do índice de 1,6% anualizados para o PIB norte-americano no terceiro trimestre (julho, agosto e setembro), as perspectivas para o quarto trimestre, encerramento do ano de 2006, são ainda piores.
1.1.1. A bomba estatística do BEA (Bureau of Economic Analysis)
A notícia de uma BOMBA estatística do BEA (Bureau of Economic Analysis) literalmente estourou neste sábado e domingo e está sendo amplamente divulgado hoje, 29Out06, na imprensa especializada. Diz respeito aos dados do último trimestre da economia norte-americana (julho, agosto, setembro) apurados pelo BEA que estariam muito superestimados. Foi divulgado 1,6% anualizados de crescimento do PIB em relação ao segundo trimestre, quando talvez devesse ser de apenas 0,9%, o que significa que tecnicamente a economia norte-americana já estaria se aproximando rapidamente de uma recessão, talvez já para o último trimestre de 2006.
Nesta sexta-feira pela manhã veio o desempenho da economia norte-americana no terceiro trimestre (julho, agosto, setembro), taxa anualizada de crescimento de 1,6% sobre o trimestre anterior. Já em si uma brutal desaceleração, muito abaixo das já sucessivamente rebaixadas estimativas do mercado. Em julho o mercado estimava uma taxa de 3,5% anualizada para o terceiro trimestre. Ele foi revisando sucessivamente durante o período até chegar na última semana de outubro à espectativa média de 2,3%. A desaceleração em outubro poderá ser ainda maior do que 1,6%, com uma taxa de crescimento, para entre 1,0 e 1,5%, com perspectiva da economia ter sua taxa zerada,"flat" (0,0%).

No entanto, já na sexta-feira veio um estranhamento enorme dos analistas especializados na indústria automobilística norte-americana.
A taxa divulgada de 1,6% anualizados poderia estar muito superestimada pois considerava um crescimento de 26% anualizados para a produção automobilística para o terceiro trimestre. Isso se choca com a manifestação do próprio setor como se choca também com as estimativas de forte queda na produção automobilística divulgadas pelo Banco Central norte-americano.
Desde um puro e ingênuo engano até uma grosseira manipulação pré-eleitoral, o fato é que considerando-se a estimativa do Banco Central de queda no setor automobilístico, a taxa de crescimento do PIB norte-americano para o terceiro trimestre desabaria para 0,9%!
Isso significa que a desaceleração do crescimento econômico não está se dando como uma pisada suave no pedal do breque, mas basicamente como uma brusca pisada no pedal com os dois pés e ainda acionando o freio de mão.

Os especialistas já estão fazendo coro na grande imprensa especializada, exigindo um pronunciamento urgente do BEA, responsável pela estimativa de crescimento do PIB norte-americano.
Se se confirmar uma revisão tão forte para baixo do crescimento do PIB nara este terceiro trimestre, poderá haver uma desestabilização num mercado de títulos; a corrente dos economistas "pessimistas" (bearish) acredita que o mercado de títulos está alucinado, totalmente descolado das tendências objetivas da economia. É necessário acompanhar, agora, a cada momento os mercados internacionais. Muito da reversão do estado atual de alienação da política interna do operariado depende do comportamento da economia.

Outro fato que também se confirma é que o impacto do retorno da crise cíclica na economia dos países emergentes será brutal, inclusive Ásia e com destaque para China. A economia da zona do Euro também sentirá fortemente a desaceleração e a muito provável recessão para o primeiro mais tardar no segundo trimestre de 2007; no entanto, como estamos vendo agora, o cenário se abre um pouco mais e talvez já tenhamos um mergulho em taxas negativas já neste último trimestre de 2006.
1.2. Cenário hard landing: recessão no 1o (mais tardar 2o) trimestre de 2007
Tenho trazido o estado do severo debate entre os "otimistas" e os "pessimistas" a respeito da economia norte-americana. Hoje ela é a Meca do capital mundial - embora tenha perdido terreno nos últimos anos.
O resultado desse debate feroz começa a pender decisivamente e rapidamente para os bearish (pessimistas) que prognosticam hard landing para a economia norte-americana e consequentemente para toda a economia mundial.
A coisa irá desabar logo a partir de janeiro de 2007, se é que não mostra suas garras já nesses meses de Novembro e Dezembro de 2006. Os Bancos Centrais da Filadélfia e de Richmond já apontaram que nos estados do meio Atlântico o crescimento da atividade produtiva está abaixo da de setembro ou já está flat (0,0%).

1.3. Alguns fatores

Os mercados imobiliários, responsáveis por grande parte do emprego nesta última recuperação cíclica, estão ainda em queda acelerada. Isto quer dizer que está longe de um "equilíbrio". Ele está arrastando o sistema de crédito e também as vendas industriais a ele atrelados.
Há uma série de projetos que foram pegos no meio da execução. É apenas por isso que esses projetos ainda não foram paralisados. No entanto, a deflação dos mercados de imóveis não está sendo suficiente para reativar a demanda. O fato é que os analistas bearish (pessimistas) estão vendo confirmadas as suas previsões, enquanto os bullish (otimistas) estão ancorados no firme desempenho dos mercados de capitais - pelo menos até esta quinta-feira última.
1.4. Impacto na economia brasileira

O mercado de trabalho no Brasil está estagnado há algum tempo e parece que a queda no desemprego, que veio de 21% em 2003 para 16% no início de 2006 na RMSP (DIEESE), já bateu no seu vale. Já houve uma leve ascensão do patamar para em torno de 17% nos últimos meses e é daí para cima agora que a economia global parece mergulhar na crise cíclica nos próximos meses.
O impacto na economia brasileira deve ser grande desta feita. Em 2001 não chegou a ser catastrófico, fomos sentir a crise mesmo no desemprego em 2002, principalmente em 2003. Hoje as condições globais da próxima crise cíclica apontam para uma desordem sem precedentes nos mercados. A fuga de capitais da periferia para o centro será brutal, com enxugamento de todos os projetos e níveis de produção.
Podemos esperar, salvo repentina e improvável reversão de tendências, uma recessão a iniciar-se no primeiro ou no segundo trimestre de 2007 no mais tardar.
2. Previsões, cenários de incerteza e estatuto desta próxima crise cíclica

2.1. Arte da previsão
Estamos num mundo de incertezas! Não é à toa que Werner Heinsemberg e seu princípio quântico da incerteza fazem tanto sucesso. Mas é a pura dialética que vai sendo redescoberta e demonstrada a cada descoberta da ciência da natureza. O mundo é incerto, mas dentro de suas incertezas é passível de alguma previsibilidade - ele é previsível dialeticamente e não mecanicamente. A economia política clássica (Smith e Ricardo) foi primorosa em suas grandes previsões, mas Marx foi o campeão pois esgotou, teoricamente, as possibilidades do MPC, prevendo todos os seus percursos futuros. Claro, se eu sei o como e o onde, não sei o quando, a não ser por meio de probabilidade.
2.2. Talvez a maior crise desde o pós-IIa Guerra Mundial

As probabilidades de uma grande crise (o que não quer dizer ainda o "big one"), ou pelo menos uma bem maior do que as que tivemos no pós-IIa Guerra Mundial, estão aumentando decisivamente.
Estamos fazendo um acompanhamento bem rigoroso do estado da economia norte-americana através das publicações on line das grandes agências de análise econômica e também dos organismos oficiais de controle e monitoramento.
É possível já afirmar a crise para o primeiro trimestre ou o mais tardar para o segundo trimestre de 2007? Ainda não. Mas quase. São as informações sobre o desempenho econômico de Outubro para a economia USA que nos aproximaram muito dessa afirmação. Mas as informações ainda não são totalmente suficientes. Os Leading Indicators (OCDE) já apontam para uma desaceleração - este é um indicador muito importante, consistente.
3. Economia e luta de classes, a grande dialética
3.1. Economia e política

Porque esse acompanhamento da economia é importante? Porque é importante a crise! Ela altera significativamente a correlação de forças entre as classes dominantes e as exploradas. Ela altera o quotidiano da reprodução econômica. Ela pode favorecer uma politização da classe trabalhadora, aliás, uma auto-politização, uma politização em torno dos seus interesses e não pelos interesses da burguesia ou da pequena-burguesia.
Esta próxima crise econômica, no caso do Brasil, será muito importante para expor a fraqueza das "análises de conjuntura" que têm pautado a prática de várias correntes militantes, tanto ao centro como à esquerda do espectro político. Trata-se de todas aquelas análises que indo a reboque da economia política burguesa ou pequeno-burguesa (os marxismos reformistas de todo jaez) afirmaram que não estava inscrito no horizonte relevante, aquele da política corrente, a possibilidade de uma movimentação da classe proletária e do seu núcleo duro operário.
3.2. Hipótese básica das análises de conjuntura burguesas e pequeno-burguesas
É um verdadeiro suicídio político para as esquerdas ir à reboque da economia política acadêmica das correntes do marxismo reformista. Elas são consensuais em afirmar que um movimento operário não tinha perspectiva de retomada no curto nem no médio prazos, e alguns mesmo afirmavam que o longo prazo estava bem além do horizonte. Em função disso, da ausência da classe do combate, lançavam-se na "conquista do possível", lançavam-se na "resistência" a partir de "dentro das instituições", em suma, lançavam-se à política institucional compactuando com o poder ou fazendo as oposições domesticadas e abrindo, é claro, mão de pontos importantíssimos do programa histórico do socialismo revolucionário ([1]).
Mas de qualquer modo, fica comprovado que só a própria classe proletária, com seu núcleo duro constituído a partir do operariado dos setores de ponta da indústria, retornando ela própria às lutas, poderá retomar autonomamente as suas bandeiras, as bandeiras do socialismo revolucionário, as bandeiras do marxismo revolucionário.
3.3. O atual potencial das lutas operárias no Brasil

O operariado dos setores de ponta da indústria tem hoje o potencial estratégico de liderar decisivamente, a partir do socialismo revolucionário, as lutas do conjunto da classe proletária e da grande massa proletária e semi-proletária urbana e rural, o que já perfaz a grande maioria da população brasileira; mas pode liderar também a pequena-burguesia pobre que é formada por setores dos serviços urbanos e o campesinato pobre. Esse potencial lhe é solidamente conferido a partir das condições objetivas lato sensu, resultado da acumulação do capital nestas últimas cinco décadas no Brasil. Assim temos confirmada a hipótese de trabalho com base na demografia econômica, de que no Brasil o proletariado perfaz a grande maioria da população economicamente ativa e que já tem dentro de si um núcleo duro operário industrial consistente, firmemente instalado nos setores de ponta da economia e que nucleia toda a atividade econômica em torno de si - por isso o operariado dos setores de ponta é o núcleo estratégico gerador de valor e valor de uso de toda a reprodução social.
Se estamos falando de um potencial objetivo determinado pela base econômica hoje, ficamos então por conta da efetivação desse potencial para a qual a conjuntura econômica com a perspectiva de retorno da crise cíclica constitui um dos principais fatores.
3.3. Luta política e teórica na realização do potencial operário

A partir daí é que as condições propriamente subjetivas começam a jogar o seu papel: em que medida os militantes da política operária estarão aptos a lutarem no seio da classe pela sua politização revolucionária, lutando pela sua auto-organização em partido revolucionário com base no marxismo revolucionário? É a arte da política revolucionária que, no Brasil, entrará finalmente na práxis da classe com possibilidades inéditas de êxito.
Quanto ao elemento mais político (intra-classe) da atual conjuntura, alguns sinais muito tênues indicam que o movimento operário tem potencial e condições de uma retomada firme no Brasil. Esses tênues sinais são promissores na medida em que a conjuntura econômica internacional está se confirmando muito favorável, com a alta probabilidade de uma crise cíclica bastante forte espoucando no primeiro trimestre do próximo ano a partir da Meca do capitalismo, a economia USA.
3.4. Condições atuais e as condições de 1978-80 para as lutas operárias

Ao mesmo tempo, veremos mais uma tentativa desesperada do reformismo em assumir o controle dos núcleos mais combativos da luta econômica operária, uma vez fracassada a recente tentativa feita pelo PSOL. Hoje há uma série de fatores que são muito desfavoráveis a essa tentativa de absorção do socialismo burguês e pequeno-burguês:

a) não há uma questão democrática posta (em 1978/79/80 estávamos sob ditadura militar);
b) a social-democracia, via PT e CUT, acabaram de completar o seu primeiro ciclo histórico; nesse término de ciclo ela absorveu no jogo do poder institucional do capital uma grande parte das organizações operárias e com isso tornou-se explicitamente e flagrantemente uma força "pelega" na política operária - não há meio dela retornar à extrema combatividade operária que, no entanto, será a tônica do período que se abre a partir de janeiro de 2007;
c) a experiência vivida nos últimos quase trinta anos de absorção pela social-democracia deu elementos sólidos de referência para o combate ao sindicalismo social-democrático, para o combate ao sindicalismo domesticado.
No entanto, como em 1978-80, a perspectiva é que a passagem ou transição da fase da luta econômica para a da luta política da classe talvez seja muito curta.

Conclusão

Nesse sentido é que o que está em jogo frente aos cenários de retorno da crise cíclica é de transcendência para a política intra-classe.
É sempre bom lembrar que ainda se tratam de cenários, porém o mais otimista dos cenários para a acumulação mundial fala em 'desaceleração', para um Soft Landing, enquanto o mais provável, smj, é o de uma 'recessão' para o Hard Landing. Estamos no momento crucial do ciclo, pois caso não sobrevenha a crise, o capital mitigará esta baixa com recursos que ainda não estão totalmente visíveis para a análise (China, Índia, gastos militares...?).
Os cenários estão abertos.

***

Notas


* a data de veiculação original desta análise foi mantida; não revisado.
[1] Vide crítica de Marx a Lassalle.

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