terça-feira, 30 de dezembro de 2008

- Mil Vietnãs ou Mil Rússias? 07Nov07


Dialética do desenvolvimento das forças produtivas e a Revolução Latino-americana

por Ivan J., 07Nov07[1]



Pergunta-se[2]: "...existiremos ainda, os seres humanos?" (Camarada Prachanda, in Esk)
Sem dúvida! Qualquer hipótese-outra é apenas figura de retórica formal.
A Humanidade não cria problemas para os quais já não tenha solução. E a solução é uma só: a revolução proletária, tão inevitável quanto os estabelecimentos, choques e entrechoques dos calendários que os homens criam para si mesmos ao inaugurar outro tempo – aliás, uma ilusão dentro das ilusões: no cosmos não há dia, noite, o tempo é um contínuo/descontínuo, matéria/não-matéria.

Com relação ao nosso tempo e o da Revolução Russa:
a) El Che => "Mil Vietnãs"
b) Nosotros => "Mil Rússias... e mais"

Hoje não temos mais uma América Latina popular, se é que um dia a tivemos. Ela é proletária, tanto demograficamente como economicamente - a natureza da Revolução Latino-Americana é proletária; não será simples, mas o desenvolvimento das forças produtivas capitalistas no continente assim determinaram, ferreamente (Marx, Das K, Prefácios).

A Maldição do Etapismo

Os adversários da revolução proletária, claro, adversários do proletariado como única classe revolucionária até o fim, dirão que ainda há "cositas" a complementar, pero nosotros decímos: son cositas no más! É o etapismo revisado, requentado... é a ilusão de democracia da pequeno-burguesia que não se contenta com a existência das "imperfeições" da democracia burguesa, essa sempre concreta, real. O etapismo pequeno-burguês tem uma pulsão pelo aperfeiçoamento e purificação da democracia burguesa como pré-requisito para a transformação social. O proletariado tem sua própria democracia a oferecer como elemento da solução para o desespero e para a tragédia que o capital impõe à Humanidade – assim, para que o proletariado se sinta à vontade para deflagrar-se em luta, perseguindo suas próprias bandeiras, basta a vigência (sempre defeituosa, precária, malsã) da ordem democrática burguesa, real e concreta. E não é à toa que a pequena burguesia vê "fascismo" para tudo quanto é lado, pois precisa alucinantemente de uma ameaça constante à democracia corrente para frear qualquer radicalização proletária, ou mesmo qualquer possibilidade de radicalização prática do proletariado, por mais remota que essa se apresente – e a sua bandeira é sempre a da "unidade".
O referencial político e histórico no caso reside na eclosão do fascismo e do nazismo na Europa nos anos 1920 e 30. A "desunião" e a "radicalização" do proletariado teriam possibilitado aquelas eclosões. É necessário estudar muito mais o assunto, mas a hipótese de trabalho é que o recrudescimento fascismo e o nazismo são frutos da anterior derrota militar e política do proletariado revolucionário na Europa Ocidental e na Rússia e do vacilo e traição da própria social-democracia.

Dialética da Revolução Latino-Americana e o proletariado brasileiro

A massa econômica moderna, urbana e social proletária, operária, estabelecidas solidamente na Argentina, no Brasil e no México, falam por si só. Esta massa posta em movimento pela sucessão de crises industriais cada vez mais graves irá expor esse protagonista a ele mesmo e ao conjunto das outras forças sociais.

No Brasil encontra-se o núcleo mais forte e determinante dos destinos da Humanidade do hemisfério sul do planeta; trata-se do macro-eixo Rio-São Paulo. A determinação econômica e demográfica da região já era, nos idos dos anos 1960, decantada em prosa e verso pelo anjo do mal, Gal Golbery do Couto e Silva (Geopolítica do Brasil). Esta determinação só fez acentuar-se. Marini nos anos 1970 descreveu-o de outro modo, a partir de outro paradigma: o sub-imperialismo brasileiro. Os anos 1980 e 1990, mesmo esses poucos anos decorridos do novo milênio, não desmentiram a tendência, que acelerou-se vertiginosamente com o recolhimento geopolítico do México, com a falência geopolítica da Argentina. A Revolução Latino-Americana, proletária como não poderia deixar de ser, tem uma topografia, uma seriação ou, para usarmos o linguajar clássico, uma dialética.

Sobre ela estarei falando e discutindo em Maringá (EspMarx - Maringá) na próxima sexta-feira à noite, comemorando, entre outras efemérides, a Revolução Russa, tentando mostrar que a revolução proletária é atual para a América Latina como um todo, e que esse experimento que irá abrir-se dentro alguns anos para a América Latina será um episódio crucial para a Revolução Mundial.

São argumentos que já foram expostos em diversas análises anteriores.

O sistema econômico latino-americano em formação

Até que a classe entre em ação, o capital mesmo está providenciando - sem que nada possamos fazer, digo, a classe possa fazer – as bases de uma revolução verdadeiramente latino-americana, pois para ampliar seus espaços internos de acumulação, o capital global vem integrando as economias nacionais latino-americanas num verdadeiro sistema econômico, aliás pela primeira vez na história do continente. Esses liames concretos são agora desenvolvidos em ritmo alucinante, extrapolando a comercialidade e indo para a própria logística - isto determina de modo crescente uma produção verdadeiramente social abrangendo o continente, tratando-se do surgimento do trabalhador coletivo ao nível continental. Instalam-se com velocidade recorde os liames concretos dessa irmanação forçada, dado que o protagonista inelutável é o capital. Mas essa ação do capital é inelutável apenas por enquanto.

A crise cíclica que agora aprofunda-se insofismavelmente no centro do sistema, e que já vai chegando assustadoramente para o resto da periferia, em especial a industrializada (os BRICs, por exemplo), promete colocar o proletariado em movimento, em especial seu núcleo duro operário. O impacto será violento. O operariado ainda está sem tradição revolucionária orgânica no continente, é um operariado que já fez alguns enfrentamentos históricos importantes, mas que não tiveram qualquer possibilidade de desdobrar-se em experiências mais sólidas, mais envolventes, com mais aprofundamento para enraizar-se. Teremos que forjar, a partir da própria práxis que irá abrir-se, uma nova memória, uma memória dialética, cujas condições de luta irão determinar, também ferreamente, que somos herdeiros de 1848, 1871 e, last but not least, de 1917! As experiências que o proletariado industrial moderno teve na sua formação no decorrer do século XX na América Latina foram efêmeras. Em especial temos os casos da Argentina no final dos anos 1960 e início dos 1970, temos o caso do ABC em São Paulo dos anos 1978-82/85...! No Século XX, após a derrota da Revolução Russa, sucederam-se em nível global várias gerações de `classe em si' que para a América Latina, apesar destes dois episódios isolados, jamais conseguiu constituir-se em partido de classe - e de fato esse foi o caso, claro, do proletariado industrial em rápida formação.

Revolução Russa – comemoração, balanço e conjuntura

O mundo está entrando numa outra conjuntura, conjuntura de esgotamento de uma ordem mundial – e é isso tem que ser confirmado a cada episódio cíclico do capital mundial, pois diferentemente das formulações correntes com base nas "ondas longas" e etc, na teoria marxiana dos ciclos e tendências econômicas não há qualquer elemento endógeno que garanta a inevitabilidade desta tendência. O ciclo é inevitável endogenamente. Mas a tendência se constrói.
Comemorar a Revolução Russa é, nas condições que estamos vivendo, muito mais do que relembrá-la. Trata-se de reavivá-la, incorporá-la, de modo crítico, de modo que possa nos fornecer as grandes lições necessárias a serem plenamente utilizadas na Revolução Latino-Americana. Trata-se, então, de retomarmos as nossas mais profundas raízes de classe, retomarmos e atualizarmos todo o conteúdo da Revolução Russa para o atual nível de desenvolvimento das forças produtivas alcançado em nosso continente, certamente infinitamente superior ao da Rússia do início do Século XX. Mas tanto na Rússia como na América Latina, incluso as suas três economias-chave, temos uma realidade periférica industrializada, em que o padrão de acumulação tem como fundamento a extração predominante da mais-valia absoluta.

As lições políticas da Revolução Russa, sem dúvida, são as mais importantes, tanto na auto-organização da classe, como na política de alianças – e aqui, para mim, a grande expressão daquela época, embora não tenha sido a única, foi Lênin. O conjunto da sua obra escrita foi o seu maior legado para as gerações subsequentes. Uma obra hercúlea, impecável, em que a centralidade da classe proletária e, no interior da classe, a centralidade do operariado industrial, estão fulgurantemente presentes da primeira linha à última; em que o socialismo revolucionário, o socialismo proletário, não se confunde em nenhuma partícula com os socialismos burguês e pequeno-burguês. Uma obra em que a tese clássica da inevitabilidade da "democracia proletária" é defendida e perspectivada concretamente, na práxis quotidiana interior à classe, com uma disciplina sobre-humana. Aqui Lênin reverbera com fidelidade o seu referencial: Marx e Engels. Mais leio, mais encontro textos preciosos que cabem como uma luva no nosso contexto histórico, onde a identidade com a realidade russa revolucionária é imediata, dado que lá como aqui a revolução proletária nos termos clássicos (Marx) aparece como um fato não só viável ou possível historicamente, mas um fato inevitável.

A América Latina proletária de hoje é um dos fatos mais importantes da história mundial. Mas sua base é a atual América Latina capitalista.
Se é assim, espreita, sem interromper um minuto a sua frenética atividade, a 'velha toupeira"...

Sinais da crise, cenários da crise

Hoje/ontem, dia 7 de novembro do ano da Graça de 2007, as bolsas americanas sofreram um enorme choque. A luta para os mercados permanecerem à tona gera espasmos cada vez mais pronunciados, é a volatilidade cada vez maior - os responsáveis pela gestão coletiva dos mercados estão queimando sua última munição para fazer uma respiração boca a boca junto aos seus fundos, suas indústrias. Para isso emitem, guerreiam. Mas a fuga de capitais dos USA já está se manifestando cada vez mais a cada dia que passa. Além das emissões suicidas de Bernanke, os que têm dólares especulativos estão começando a "desencaixar", "desovar", em suma: fugir do dólar. Isso aprofunda irremediavelmente a desvalorização da moeda americana, o que se expressa na ascensão de todos os demais preços internacionais: inflação global. Mas no fundo de todo esse espetáculo financeiro está a produção com sua crise cíclica industrial, que teve início no último trimestre de 2006 e está se aprofundando vertiginosamente no centro do sistema no decorrer de 2007, com uma história própria que está muito longe de encerrar-se.

Em geral as crises desabam; ou, de outro modo, são meio que imperceptíveis (nesse caso são os soft-landing). Esta crise não desabou de pronto, escolhendo uma aterrisagem aparentemente mais, por assim dizer, suave. No entanto, as aparências enganaram e seu percurso não se configurou como um soft-landing. Essa resistência do capital em entregar-se à crise cíclica acabou gerando um cenário de crise ainda mais grave, tão grave que cenários inimagináveis para este momento acabaram por configurar-se. Fala-se agora corriqueiramente nos mercados globais em "hiperinflação do dólar", "grande depressão", "falência do padrão monetário mundial", "double dip" nos moldes de 1978-82 e, last but not least, em "1929". Se e em que medida um ou outro cenário irá desdobrar-se na realidade concreta, isso vamos acompanhar atentamente.
Mas uma coisa já é muito certa: esta crise cíclica global está se desenhando como a mais grave já vivida desde o fim da Segunda Guerra Mundial. O seu impacto no resto do globo será terrível, inclusive na América Latina e, em especial, no Brasil. A fantasia de uma "economia melhor preparada" para enfrentar as "instabilidades" globais irá ruir em segundos, expondo as fragilidades desesperadoras da sustentação da vida nas plataformas capitalistas de reprodução social e econômica que estão instaladas no país. O macro-eixo Rio-São Paulo irá expor sua verdadeira natureza caótica nesse contexto de crise.

Conclusão

Nossa ferramenta básica é a teoria. Ela nos guia quando se trata de compreender a realidade. A vitória teórica da "economia política dos trabalhadores", das teses econômicas clássicas expostas em "O Capital", é completa através do confronto com toda essa rica realidade do Século XX, um verdadeiro arco de eventos históricos que liga uma emergência proletária a outra: no caso a última vaga revolucionária, cujo maior episódio foi a Revolução Russa, à próxima vaga revolucionária que irá iniciar-se, se é possível intuir um referencial de tempo, no máximo em uma ou duas décadas. Isto que dizer que, a partir de um referencial teórico comprovadamente válido, todos os fenômenos observados nessa conjuntura corrente, a dessa crise cíclica, são também observáveis e compreensíveis, isto é, compreensíveis a partir do referencial econômico marxiano, especificamente marxiano; importante frisar que as teses econômicas desse referencial nunca vêm sozinhas, elas se fazem acompanhar pelos seus desdobramentos lógicos e inelutáveis na dimensão política e etc.
Excelentes comemorações da Revolução Russa.

Mis besos a todos,Ivan J.
Notas

[1] Manteve-se a data original de publicação; subtítulos foram acrescentados.
[2] Versão já revisada e complementada daquela que está in http://br.groups.yahoo.com/group/eskuerra/message/45778

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